Keren Bonfim
A pauta agora é as mulheres: Mais belas que Megan Fox
Lila Abu-Lughod escreve sobre a mulher mulçumana e sua burca
perguntando-se: “as mulheres mulçumanas precisam mesmo de salvação”? Fala sobre
o discurso de Laura Bush, que afirma ser uma das consequências da ‘Guerra ao
Terrorismo’ a liberdade das mulheres mulçumanas. Porém, o que é a liberdade das
mulheres no mundo contemporâneo? Quem define o que é ser uma “mulher evoluída”?
Hoje ser evoluída pode significar não aceitar a burca e a submissão ao marido,
porém quem é essa mulher evoluída?
Devemos tomar cuidado para não reduzir as diversas situações
e atitudes de milhões de mulheres muçulmanas para uma única peça de roupa. Talvez
seja hora de desistir da obsessão americana com o véu e focar em questões mais
sérias com as quais as feministas e outras deveriam de fato estar
preocupadas.[1]
Quando colocamos que uma mulher do ocidente é evoluída
estamos rebaixando as mulheres do oriente a inferiores. Criamos então
estereótipos. Ninguém obriga as mulheres de alguns países do oriente (como
colocado pela autora em seu artigo As mulheres mulçumanas precisam mesmo de
salvação?), entretanto, elas continuam com seus costumes. Se ninguém as obriga
à submissão porque temos que obrigá-las a aceitar o valor de “mulher evoluída”?
As autoras Jussara Reis Prá e Léa Epping ao discutirem
direitos humanos universais destacam os direitos femininos como, por exemplo,
os relacionados à liberdade sexual
Ao avaliar retrospectivamente o caminho percorrido pelas
mulheres nas três últimas décadas, não podemos deixar de perceber o seu esforço
para mudar as normas vigentes sobre as concepções de gênero e estabelecer as
bases para buscar a igualdade de direitos. Sem dúvida, a experiência
participativa das brasileiras e seu empenho junto às Nações Unidas e a
instâncias sociais e governamentais forneceram os recursos necessários para
empreender essa caminhada. Porém, ao pensar nos próximos decênios, podemos perceber
que essas práticas continuam a demandar atenção, apesar de evidenciarem muitos
resultados exitosos. O aparente reconhecimento da cidadania feminina e a sua
inclusão em programas de governos e em agendas nacionais, a partir dos anos
1990, não têm se mostrado capaz de garantir todos os direitos humanos a todas
as mulheres. Portanto, essa tarefa continua imperativa para quem defende a
expansão da cidadania feminina e a equidade de gênero.[2]
Ao falarmos na mulher na sociedade contemporânea o feminismo
vem com força nas nossas cabeças, e não é à toa. Todos - ou pelo menos grande
parte - dos avanços na história estão relacionados ao feminismo. A queima de
sutiã em praça pública na França. A invasão feminina no mercado de trabalho. A
luta da Maria da Penha. Atualmente a Marcha das Vadias. São todos exemplos do
poder que as mulheres - ditas minoria - têm.
Maria da Penha representa uma grande parcela de brasileiras
que sofrem repressão daqueles que deveriam ser seus maiores incentivadores:
seus companheiros. Sua história todos conhecem, porém há muitas “Marias da
Penha” que não tem a coragem de denunciar seus maridos ou namorados pela
agressão que sofrem. Sendo assim, viram vítimas do seu próprio medo. Maria
conta que em sua época “era vergonhoso demais mostrar que a gente sofria
violência” E hoje depois de ter passado por tudo relata:
Em todo lugar que eu vou tem alguém que diz que foi salva
pela lei, que se não fosse a lei poderia estar morta e nas comunidades mais
carentes eu vejo ‘quando meu vizinho foi preso meu marido nunca mais bateu em
mim’. E hoje essa mulher pode sair de casa com a certidão do seus filhos,
chegar numa delegacia e dizer ‘olha, eu não tenho condições, não quero que ele
conviva mais comigo’ e as medidas protetoras são dadas a essa mulher. Ele é
retirado de casa e se ele desobedecer a essa ordem vai ser preso. Essa lei tem
a cara do que o Brasil precisa em relação a mulher e realmente está fazendo a
diferença hoje. [3]
Antigamente a mulher era "escrava" da cultura
machista que a obrigava a seguir determinadas ordens e hoje vemos em como, em
alguns casos, essas mesmas mulheres escravas da visão da "mulher
evoluída", que apregoa: todas têm que ser independentes, terem sua renda,
casa própria, dirigir seu próprio carro. Isso parece ser interessante, mas até
o momento que não interfere na vida dos outros. Não podemos decidir que ser
independente é o certo e querer aplicar isso à força nas culturas orientais,
como o exemplo tomado no começo do texto.
Também vemos mulheres escravas da beleza, que fazem de tudo
para estar dentro dos padrões que se impõem, deixam de comer aquele doce para
caber num manequim menor. Claro que sentir-se bem, achar-se bela é importante
para autoestima, aceitar-se do jeito que é. Mas até onde essa massificação de
uma beleza exagerada é positiva para as mulheres?
Para algumas pesquisadoras na área da comunicação ainda
vivemos uma sociedade machista e parte dessa culpa é dos meios de comunicação.
No livro Mulher e mídia: Uma pauta desigual? é colocado que a imprensa, muitas
vezes, já tem uma ideia e um posicionamento pré-definidos quando a pauta é
mulheres e alguma bandeira feminista. Levando em consideração o forte impacto
emocional que tais matérias geram há, mesmo assim, uma tentativa de diminuir
essas ideias pré-existentes antes da apuração.
O livro também debate a concepção de leitor que consome
esses tipos de mídia. São passivos que só conhecem o feminismo pelo que a mídia
conta ou procuram informação por conta própria? Fátima Jordão, socióloga,
argumenta que ”os leitores são perfeitamente capazes de se interessar e
acompanhar matérias mais longas nos jornais, desde que elas tenham um
tratamento adequado.”
Todas essas referências nos fazem repensar o papel da mulher
na sociedade contemporânea ocidental. Será ela mesmo machista? Será ela com um
toque feminista de “mulher independente”, como uma vítima ou como uma guerreira
que levanta as bandeiras de sua luta? Seja qual for a maneira que ela queira viver
o mínimo que a sociedade precisa é aceitar como certo o seu jeito, afinal, na
nossa era, dita pós-moderna, há espaço para todas.
Luana Caroline do Nascimento
REFERÊNCIA:
EPPING, Léa & PRÁ, Jussara Reis. Cidadania e feminismo
no reconhecimento dos direitos humanos das mulheres. Disponível em:
http://www.ieg.ufsc.br/revistas.php .Acessado em: <18/09/2012>
FERNANDES, Maria da Penha Maia. Entrevista à Igreja
Adventista. Disponível em: http://vimeo.com/13936716. Acessado em:
<20/09/2012>
LILA, Abu-Lughod. As mulheres mulçumanas precisam mesmo de
salvação? Reflexões antropológicas sobre o relativismo cultural e seus Outros.
Disponível em: http://www.ieg.ufsc.br/revistas.php .Acessado em:
<18/09/2012>
OLIVEIRA, Guacira César de; MELO Jacira & LIBARDONI, Marlene
(org.). Mulher e mídia: Uma pauta desigual? São Paulo. CFEMEA/RedeSaúde. 1997
[1] LUGHOD, Lila Abu, 2012
[2] PRÁ, Jussara Reis e EPPING, Léa, 2012
[3] FERNANDES, Maria da Penha Maia, 2010